Há 20 anos, Eduardo Valente realiza sua retrospectiva de cinema. Você sabe quem é. Valente venceu o prêmio de curta em Cannes (Um Sol Alaranjado), dirigiu longas (No Meu Lugar), foi curador do Festival de Brasília
Há 20 anos, Eduardo Valente realiza sua retrospectiva de cinema. Você sabe quem é. Valente venceu o prêmio de curta em Cannes (Um Sol Alaranjado), dirigiu longas (No Meu Lugar), foi curador do Festival de Brasília. O evento começou em 2001, abarcando o cinema brasileiro dos anos 1990, prosseguiu em 2011, cobrindo os anos 2000, e chega agora, em 2021, com os anos 2010. Intitulado Cinema Brasileiro: Anos 2010, 10 Olhares, o festival ocorre de 22 a 30 de abril e pode ser visto no site www.100lhares.com. É gratuito. Serão exibidos 75 filmes, entre curtas e longas e a programação será acrescida de dez debates, tudo abrigado na plataforma Belas Artes à La Carte, parceira do evento.
Diferentemente das duas edições anteriores, Valente dessa vez resolveu compartilhar a curadoria, convidando dez curadores e curadoras para selecionar os títulos. "Todos tiveram plena liberdade para propor títulos e aproximar filmes, mas também nos reunimos para trocar ideias sobre o que esses olhares, em seu conjunto, podiam projetar sobre a produção brasileira da última década." Os anos 2010 começaram muito ricos para o cinema do País, em especial por conta das políticas públicas, que começaram a se desenhar na década anterior. "Foram produzidos cerca de 2 mil filmes, que fomos listando e dividindo em eixos temáticos."
A situação começou a se complicar a partir do processo de impeachment, em 2016. Muitos artistas - diretores, atores - tomaram posição contra a deposição da presidente Dilma Rousseff. Tudo se agravou em 2019, com a ausência de uma política cultural pelo governo de Jair Bolsonaro. Em vez de apoiar o cinema, ele fez o que pôde para dificultar a produção. Mesmo assim, foi um ano de consagração internacional, com os prêmios para Karim Aïnouz e Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles, em Cannes, pelos filmes A Vida Invisível e Bacurau. No ano passado, por conta da crise sanitária, os cinemas fecharam, mas os diretores continuaram trabalhando e buscando alternativas de produção e distribuição. Festivais e lançamentos ocorreram online. O festival Olhares está sendo financiado pela Lei Aldir Blanc, criada para socorrer o setor cultural atingido na pandemia.
Projeção internacional
Valente conta que o fazer cinema, para ele, não é só realizar filmes. Como parte do seu doutorado, no Rio, ele tem dado aulas para uma turma de 40 alunos. Seu tema é a produção cultural e a resistência que se pode exercer em curadorias e festivais. Na semana que vem, seus alunos terão um encontro com Kleber Mendonça Filho. Estão entusiasmados - Kleber, por sua projeção internacional, virou referência para todo jovem que sonha fazer cinema no Brasil
Face às dificuldades, a produção brasileira atual divide-se entre produções comerciais, voltadas ao mercado, e um cinema exigente, independente e autoral. Essa segunda tendência é representada no festival por filmes como A Vizinhança do Tigre e Arábia, de Afonso Uchôa (o segundo é codirigido por João Dumans), Martírio, de Vincent Carelli, sobre os massacres de índios na fronteira paraguaia, Inferninho, de Guto Parente e Pedro Diógenes, A Cidade É Uma Só, de Adirley Queirós, Meu Nome É Bagdá, de Caru Alves de Souza, Luz dos Trópicos, de Paula Gaityán. Entre os curadores, estão Carol Almeida, que agrupou seus filmes preferidos sob a bandeira A Cidade e as Brechas Ocupadas, e Cleber Eduardo, Espaços Concretos de Vidas em Cinema.
Os dez, suas justificativas e escolhas, estão no site do festival. Cleber que, durante anos, fez a curadoria da Mostra Aurora, de Tiradentes, escreve: "Meu segmento enfatiza uma linha de força que conecta os modos de vida de personagens (A Vizinhança do Tigre, Baronesa, Um Filme de Verão, Diz a Ela Que Me Viu Chorar) com os espaços geográficos/sociais de suas vivências, amalgamando a vida das pessoas fora da tela e das personagens na tela, sem deixar de haver jogo e criação para os filmes, reelaboração da vida cotidiana por dentro da vida e no cinema, tensionando a autenticidade de corpos, espaços e falas com a elaboração cinematográfica, sem ter de formar pacto com a ficção ou o documentário, muito pelo contrário".
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.