Sem atendimento com especialista, pacientes têm apenas receitas renovadas
Centro de Atendimento Psicossocial (CAPS-Bela Vista) (Divulgação)
A rede pública de saúde conta com apenas quatro médicos psiquiatras, segundo informação oficial. Informações não oficiais, porém, garantem que há apenas dois profissionais na ativa, sendo um no Centro de Atendimento Psicossocial (CAPS-Bela Vista). A expectativa da Secretaria de Saúde, para suprir essa carência, era contratar, em processo seletivo emergencial, cinco especialistas, que trabalhariam 40 horas semanais cada, com realização de três consultas por hora. Isso significa 480 consultas por mês para cada um e 2.400 consultas mensais, contabilizando a produção prevista para os cincos profissionais. Esse cálculo dá uma dimensão da demanda reprimida na Rede de Atendimento Psicossocial (RAPS) do município.
No entanto, apenas dois médicos psiquiatras se submeteram ao concurso e foram aprovados. Segundo a assessoria de imprensa da pasta, a convocação dos aprovados está prevista para acontecer nos próximos dias. Mas nada garante que eles de fato aceitarão as condições de trabalho propostas. Com dois novos especialistas, a produção da rede ampliaria em 960 consultas adicionais por mês, o que não seria suficiente para dar conta da necessidade.
Diante desse quadro de dificuldades, há consultas de retornos de pacientes psiquiátricos sendo agendadas apenas para março do ano que vem. São pacientes que foram atendidos pela última vez em março deste ano. Ou seja, vão ficar praticamente um ano sem uma avaliação mais segura sobre seu quadro clínico.
A Gazeta conversou recentemente com um paciente preocupado com a situação, porque ele estava precisando de uma avaliação melhor do seu quadro de saúde e terá de esperar 2022 para isso. “O ajuste do medicamento depende desse profissional e de nenhum outro”, argumentou. Segundo ele, a situação em que se encontra deve ser a mesma de muitos outros pacientes da cidade que fazem uso contínuo de medicamento.
Para contornar a situação
Segundo a Secretaria de Saúde, há pacientes que precisam do especialista, mas acabam sendo atendidos por enfermeiras, nos CAPS, ou por clínicos, nos postos de saúde da Atenção Básica. Nesses locais, eles conseguem basicamente atualizar receitas para retirada de medicamentos de uso contínuo. Em casos extremos, a UPA Piracicamirim se torna porta de entrada para os pacientes em surto, onde há médico de emergência apenas e não psiquiatra.
A reposição das vagas em aberto na rede para a especialidade havia sido tentada com a convocação de todos médicos psiquiatras aprovados no último concurso, porém, sem sucesso. O que obrigou a Secretaria de Saúde a abrir um processo seletivo emergencial, com 32 vagas para médicos, sendo cinco para psiquiatras. A prova de seleção aconteceu no dia 17/10. O resultado preliminar foi divulgado dia 22/10.
O professor Kalil Duailibi, psiquiatra e professor do curso de Medicina da Universidade Santo Amaro, Unisa, que coordenou a rede de saúde mental do município de São Paulo, disse que a contratação de psiquiatra para a rede pública de saúde deve ser para 20 horas de trabalho semanais e não para 40. "Ao invés de contratar um, você contrata dois. Resolve o problema do SUS e não dificulta o trabalho do profissional em seu próprio consultório. Senão você fica sem nenhum, porque o salário pago pelo poder público é baixo frente ao que o profissional pode ganhar com seu próprio consultório", explicou.
Kalil disse também que o ideal, para pacientes estabilizados, são três consultas ao ano. "Dessa forma há tempo hábil para fazer o ajuste dos medicamentos em caso da necessidade de alteração de dosagem, por exemplo". Ele sugeriu ainda que cada psiquiatra atenda durante metade do seu tempo em um CAPS e a outra metade dê suporte às unidades de Atenção Básica. "Cada um teria quatro unidades para as quais ele se torna supervisor para os casos psiquiátricos que chegam nessas unidades, dando suporte ao clínico, em um sistema de matriciamento", concluiu.