Casal mora em Rio das Pedras mas trata os filhos autistas em Piracicaba; barreiras impedem o tratamento completo (Mateus Medeiros/Gazeta de Piracicaba)
A dificuldade em vencer barreiras enfrentadas pelos três filhos autistas, e o dia a dia que exige paciência e extrema cuidado, levaram Daiane Priscila da Silva Santos Ladeira, 34 anos, a criar uma página no Facebook compartilhando a rotina dos meninos e também conhecendo outras famílias que passam pelo mesmo problema.
Essa semana a página, que tem como título "Vivência e dificuldade com o meu trio autista", completou 11 mil seguidores. Além de pessoas de outros estados, como Ceará, Amazonas, Pará, Rio grande do Sul e Rio de janeiro, os três irmãos autistas Daniel (12), Vitor Matheus (11) e Gabriel (9), já estão sendo vistos por pessoas que moram em outros países, como Estados Unidos, Reino Unido, Espanha, Alemanha, Japão, Argentina e Suíça.
A postagem mais recente de Daiane nessa semana mostra o filho mais novo, Gabriel, na sessão de terapia feita em Piracicaba. Ela mora em Rio das Pedras, nesse dia o transporte demorou muito e o menino entrou em crise.
Quando isso acontece ele quer ir para o meio da rua ou tenta morder o pai, Bruno Rodrigues Ladeira, e é um tanto difícil controlar. Aliás, Gabriel só aceita a presença do pai em tudo que vai fazer, ou seja, para comer, tomar banho, remédios etc.
"Neste dia, como a van vai de Rio das Pedras para Piracicaba, se o motorista o apanhasse primeiro e circulasse com ele pela cidade, já que a terapia dura apenas 30 minutos, ele ficaria mais calmo. Mas, primeiro, ele foi buscar outras pessoas em consultas e deixou o Gabriel por último. Ele acabou ficando nervoso e entrou em crise porque é difícil para uma criança autista ficar esperando tanto tempo", explicou a mãe.
“Há quem diga, de acordo com ela, que é birra e que o menino merece umas palmadas. Mas, só a gente que tem o filho autista sabe o quanto é difícil lidar. E, não faz sentido castigar", diz a mãe.
Outra postagem que Daiane fez e que chamou bastante atenção diz respeito ao filho mais velho, o Daniel, que conseguiu se superar fazendo exercício numas das barras da academia ao ar livre que fica perto da casa da família.
"O Daniel tem muita dificuldade com a coordenação motora e se acabava de medo de cair. Nesse dia falei com ele várias vezes: vai filho, você consegue. Ele foi devagarinho, exercitando as pernas, e quando vi já estava balançando. Foi uma vitória para ele".
Regressão no tratamento
Segunda Daiane, por terem ficado sem alguns tipos de atendimentos médicos durante a pandemia, os meninos regrediram no tratamento. Um dos problemas foi ter ficado sem as sessões de terapia, sem contar que o psiquiatra que estava no caso saiu e eles agora estão aguardando a nomeação de outro profissional.
A médica neurologista que atendia os meninos também não está mais no plano de saúde, de acordo com a mãe, então eles estão sem atendimento com neurologista. No momento, ela espera a resposta da secretária de um médico porque é necessário levar os três juntos no mesmo dia.
"Outra coisa que vem dificultando muito para nós é que o plano de saúde não permite que tenhamos o contato telefônico do profissional que nos atende. Por isso, quando meus filhos entram em crise eu e meu marido temos que nos virar porque nós não podemos ligar para ninguém e pedir um apoio", revela.
"O meu filho mais velho precisa fazer um canal no dente e a dentista gostaria de falar com psiquiatra para perguntar sobre a medicação a ser usada, já que o menino precisa ser sedado no dia do procedimento. Ela não conseguiu porque o psiquiatra se recusou a passar o contato dele, alegando que não vai falar com uma profissional que não seja do convênio. Estou quase conseguindo o tratamento pela Faculdade de Odontologia de Piracicaba", fala esperançosa.
Tem mais um problema que Daiane está enfrentando, de momento, que é com a volta às aulas. Os dois filhos dela que têm o autismo menos agressivo não terão mais auxiliar em sala de aula e o Vitor, que é o que tem o autismo mais severo, terá que esperar a escola chamar para começar o ano letivo.
"Somos de uma cidade, só encontramos a maior parte do atendimento em cidade vizinha, ouvimos falar muita coisa, muita promessa que vão resolver os problemas, mas, na prática, não funciona", completa.
TEA
O autismo, atualmente chamado de Transtorno do Espectro Autista (TEA), é uma condição caracterizada por comprometimento na comunicação e interação social, associado a padrões de comportamento restritivos e repetitivos.
Os sinais do TEA começam na primeira infância e persistem na adolescência e vida adulta. A condição acomete cerca de 1% a 2% da população mundial, com maior prevalência no sexo masculino, e as causas são multifatoriais, com grande influência genética, mas também com participação de aspectos ambientais. Algumas outras condições podem acompanhar o TEA, como transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), depressão, epilepsia e deficiência intelectual, essa com ampla variabilidade.
O tratamento do TEA é baseado em terapias de reabilitação que devem ser direcionadas de acordo com as necessidades de cada pessoa e envolvem equipe multidisciplinar. Os principais objetivos do tratamento são melhorar a funcionalidade social e as habilidades de comunicação e reduzir comportamentos negativos e não-funcionais e, assim, contribuir significativamente para a qualidade de vida das pessoas com TEA e de seus familiares/cuidadores.
Sabe-se que o tratamento precoce tem grande impacto no prognóstico. Ambientes com acessibilidade, educação inclusiva, programas de suporte e a inclusão no mercado de trabalho têm contribuído substancialmente para a melhora da qualidade de vida desta população.
A página de Daiane pode ser acessada no endereço: https://www.facebook.com/DaianeBrunoLadeira?mibextid=ZbWKwL