Há oito anos, dois jovens sem documentos fizeram algo impensável: deixaram que guardas os prendessem na fronteira americana, para se infiltrarem em um centro de detenção privado na Flórida, com o objetivo ambicioso de impedir as deportações estando dentro do local
Há oito anos, dois jovens sem documentos fizeram algo impensável: deixaram que guardas os prendessem na fronteira americana, para se infiltrarem em um centro de detenção privado na Flórida, com o objetivo ambicioso de impedir as deportações estando dentro do local.
A um mês de eleições em que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, busca o segundo mandato para continuar sua agenda anti-imigração, o documentário "Los Infiltrados" fala sobre a "fuga ao contrário" desses ativistas na televisão pública nacional, a PBS.
"Uma das questões centrais deste filme é qual liberdade, poder e dignidade os migrantes devem ter neste país, também uma das questões desta eleição", explica o cineasta peruano-americano Alex Rivera à AFP, que co-dirige esse documentário com sua mulher, Cristina Ibarra, uma americana de origem mexicana.
"Os direitos da população que não possui documentos nos Estados Unidos talvez nunca tenham sido um tema tão em alta e tão importante como agora", afirma Rivera, que descreve o filme como a história de um grande golpe, "um "Onze Homens e um Segredo" da imigração".
O ex-presidente democrata Barack Obama foi chamado de "deportador-em-chefe" por causa dos 3,2 milhões de imigrantes que expulsou do país entre 2009 e 2016, política que foi "um grande erro", diz hoje Joe Biden, seu ex-vice-presidente e adversário de Trump nas eleições presidenciais de novembro.
A maior cifra anual de deportações sob o governo Trump (337 mil em 2018) é menor do que o recorde de Obama (mais de 400 mil anualmente de 2012 a 2014), segundo o Pew Research Center.
Trump não cumpriu até o fim sua promessa de construir um muro com o México ou de deportar 3 milhões de pessoas sem documentos (expulsou menos da metade), mas, durante seu governo, a polícia migratória ICE ampliou seu poder de deter estrangeiros.
As prisões na fronteira com o México aumentaram mais de 50% em 2019 devido à chegada de mais famílias, a população de imigrantes sem papéis presos no país cresceu fortemente e foram impostas medidas para desestimular o pedido de asilo.
"Los Infiltrados" - que também poderá ser visto até 5 de novembro no site pov.org (Point of View), programa da PBS para filmes independentes de não-ficção - conta a história verídica de dois membros da Aliança Nacional de Jovens Imigrantes, um grupo de radical de "Dreamers".
O documentário é baseado em material documental e remontagens do que aconteceu dentro do centro de detenção do condado de Broward, na Flórida. O objetivo é que o público possa assistir a "uma boa história" e, ao mesmo tempo, "ver uma questão conflituosa sob uma nova luz", com imigrantes que são "agentes do seu próprio destino", disse Cristina Ibarra à AFP.
"Desde 2012, seguimos assistindo a injustiças contra o povo imigrante. Agora, as condições nos centros de detenção são, inclusive, piores, devido à pandemia", assinalou um dos "infiltrados", Marco Saavedra, hoje com 30 anos e que trabalha no restaurante mexicano da família no Bronx, em Nova York, enquanto aguarda asilo político.
Outro protagonista do filme, o argentino Claudio Rojas - que os "infiltrados" buscavam libertar da prisão - foi preso novamente após a exibição do filme no Festival de Sundance em 2019, e deportado a uma semana da estreia do documentário na Flórida. "Foi horrível (...) Foi como reviver o filme, mas com a gente dentro", contou Cristina Ibarra.
Uma série de seis capítulos lançada em agosto na Netflix, chamada "Immigration Nation" - dirigida pelos americanos Christina Clusiau e Shaul Schwarz - oferece um olhar diferente sobre a máquina de deportação policial de imigração durante o governo Trump.
Por dois anos e meio, os cineastas obtiveram permissão para acompanhar agentes do ICE em suas prisões de imigrantes que não possuem documentos.