Linnet, de 16 anos, cobre timidamente o rosto enquanto murmura, lembrando como conheceu um homem que lhe deu pequenos presentes e dinheiro, para depois abandoná-la grávida e mais pobre do que antes
Linnet, de 16 anos, cobre timidamente o rosto enquanto murmura, lembrando como conheceu um homem que lhe deu pequenos presentes e dinheiro, para depois abandoná-la grávida e mais pobre do que antes.
Milhares de adolescentes engravidam no Quênia todos os anos. Um problema exacerbado pela epidemia de COVID-19, segundo especialistas.
Algumas meninas tiveram que vender seus corpos para sobreviver, enquanto outras, forçadas a ficar em casa devido ao fechamento das escolas, tiveram relações sexuais mais frequentes.
Pouco antes da chegada do coronavírus ao Quênia em março, os pais de Linnet, agricultores em Busia (oeste), a enviaram a Nairóbi para encontrar um emprego, porque não podiam mais pagar por seus estudos.
Lá, ela se instalou na casa da irmã, do marido dela - o único com emprego - e de dois sobrinhos, no bairro de Kibera, na capital.
A comida era escassa e foi difícil resistir à aproximação, com presentes, de um motorista de "boda-boda" (moto-táxi), de 22 anos.
"Ele me comprava biscoito, sapatos e também me deu dinheiro", disse Linnet, grávida de quatro meses. Ela garante que pediu que utilizasse preservativo, mas ele o tirou durante a relação sexual.
Ele pediu que a jovem abortasse, mas o relacionamento não foi adiante. "Sou jovem demais para engravidar e agora serei mãe", lamenta Linnet. "Uma criança precisa de mingau, leite, mel. Foi minha culpa", reflete. Mas casos como o seu são muito frequentes.
Historicamente, o Quênia tem altas taxas de gravidez na adolescência. No entanto, a ONG Save the Children afirma que a taxa caiu de 82 gestações para cada 1.000 adolescentes de 15 a 19 anos em 2016 para 71 em 2017.
Mas, um documento do ministério da Saúde divulgado há algumas semanas afirma que milhares de meninas engravidaram durante o confinamento entre março e maio, provocando debates acalorados nas redes sociais.
Somente em Nairóbi, quase 5.000 meninas engravidaram, incluindo mais de 500 com entre 10 e 14 anos, segundo dados do ministério.
"Ser mãe adolescente é um desastre na vida de uma menina, que perde autonomia", pois limita e condiciona sua vida, lamentou o ministro da Saúde Mutahi Kagwe em junho.
Evelyne Opondo, diretora para África do Centro de Direitos Reprodutivos, diz que não há evidências científicas entre o aumento da gravidez e a pandemia.
Ela considera que os dados do ministério constituem apenas "a parte emergente" do problema, porque a maioria das meninas não faz esforços para obter apoio pré-natal.