Érica e Carolina não pensavam em morar no exterior, mas imigraram por amor
Karla ganhou uma bolsa de estudos. Carolina seguiu o instinto do coração. Érica embarcou no sonho do marido, e Martha realizou o desejo de morar e estudar fora do Brasil. Quatro brasileiras que imigraram para o exterior por diferentes motivos, mas que nem por isso deixaram as raízes de lado. Apesar de viverem em mundos e realidades completamente diferentes da que viviam no país, foi através da internet, ou melhor, dos blogs, que encontraram uma maneira de compartilhar suas novas experiências de vida e também matar as saudades do Brasil.
Com exceção de Martha, todas as outras três colunistas do blog: "Brasileiras Pelo Mundo", criado com o objetivo de relatar as experiências de vida de mulheres ao redor do planeta.
Karla Levy tem 34 anos e mora há nove fora do Brasil. Ela se mudou para o exterior graças a uma bolsa de estudos que o governo húngaro oferece a filhos e netos de descendentes húngaros. Na primeira viagem, ficou quatro anos morando na Europa. "Num belo dia conheci, pela internet, o meu marido. Pouco a pouco ele foi me convencendo a ir para Israel. Em quatro meses, já estava de malas prontas com destino à terra santa".
Ela diz que a principal diferença que vê entre os dois países refere-se à questão religiosa, que é bem forte em Israel. Outro ponto que ela relata ser bem diferente é que os israelenses sempre estão com pressa porque o país vive sob a iminência de uma guerra. "Eles são impacientes, vivem correndo, brigando e discutindo o tempo todo, mas me acostumei com a maneira de pensar deles. Não é fácil viver constantemente entre vários paises que desejam se atacar", diz. Por outro lado, Karla conta que quando se conhece eles a fundo, nota-se que são bem parecidos com os brasileiros. "Eles acreditam que Deus sempre vai ajudar. São alegres, gostam muito de música, de dança, futebol e basquete. Eles amam fartura de comida, principalmente nas datas festivas".
Atualmente, ela trabalha como cuidadora de idosos e tem uma filha de dois anos. O marido é um empresário israelense. "Temos o sonho de voltar para o Brasil. Acho que no fundo é o sonho de todos nós: comprar uma casinha na praia".
Karla aprendeu hebraico em um curso de formação que o governo oferece a estrangeiros. Mas em casa, garante que fala português com a filha para que ela aprenda a língua. Com o marido, reveza entre o espanhol e o hebraico. "Não tenho contato com muitos brasileiros, mas, às vezes, nos reunimos em casa para uma feijoada ou churrasco porque ninguém é de ferro". No blog, escreve sobre sua vida em Israel.
Novos Horizontes
A mineira Martha Sachser, 26 anos, diz que sempre sonhou em morar nos EUA, principalmente em Nova Iorque. "Eu via pela TV e queria viver tudo isso de perto. Hoje realizei este sonho. Estou na carreira que escolhi (fotografia) e também faço faculdade de comunicação".
Ela conta que sempre teve blogs e foi apaixonada por internet. O "NY & About" (blog) surgiu de uma conversa com uma amiga. "Tento atualizar sempre, mas tem dias que a correria é tanta que não dá. Ele já virou parte da minha rotina e poder dividir isso com tantas pessoas me deixa feliz. Espero inspirar quem sonha em morar aqui ou em qualquer outro lugar do mundo".
Martha afirma que sempre sonhou em morar nos EUA, mas como o orçamento familiar não permitia, inscreveu-se em um programa de "Au pair". "É uma das maneiras mais baratas e fáceis de morar aqui e de conhecer de perto a cultura americana". Ao descobrir um concurso que premiava a ganhadora com uma bolsa integral diz que aprendeu inglês sozinha em apenas uma semana, viajou do interior do Estado para Belo Horizonte e fez prova com 40 meninas. "Foi uma das maiores alegrias da minha vida. Estou aqui desde 2007 e me sinto realizada porque faço o que amo".
Assim que chegou aos Estados Unidos, Martha decidiu ver a fotografia como profissão. Ela estuda e faz estágio numa ONG que ajuda pacientes com leucemia a encontrar um doador compatível. "Tudo vale a pena quando fazemos o que gostamos". Hoje, mora com a mãe e um irmão e diz que não pensa em voltar a morar no Brasil. Ainda tem dois anos de faculdade e depois quer fazer outro curso.
Erica Palmeira é arquiteta de formação, nascida e criada no Rio de Janeiro. Ela diz que apesar de amar a experiência de viajar e de conhecer outras culturas, nunca imaginou mudar-se definitivamente de país. Isso até conhecer Maurício (seu marido). Ela saiu do Brasil um mês após ter se casado para ir morar em Bloomington, Indiana. A mudança aconteceu por causa do doutorado dele. "Quando tínhamos um ano de namoro ele me perguntou se eu toparia morar nos EUA e eu respondi que aceitava".
Depois de uma temporada de cinco anos nos EUA, há quatro anos, ela está em Melbourne, na Austrália. Aos 35 anos, relembra que os primeiros cinco anos fora de casa passaram por novidades, saudades, provações, viagens, adaptações, alegrias, descobertas e desafios. "Lá eu trabalhei como arquiteta, aprendi inglês na prática, tive meu primeiro filho e fiz amigos que trago comigo até hoje".
Com o término dos estudos do marido, Erica afirmou que era hora de buscarem emprego, já que não queriam ficar nos EUA. Com isso, foram para a Europa até que surgiu uma entrevista na Austrália. "Ele (Maurício) não queria fazer de jeito nenhum, mas dei um empurrãozinho porque queria mudar de continente".
No novo país, conta que foi amor à primeira vista, e que ficou impressionada com a estrutura dos bairros, a organização, o planejamento e a arquitetura de Melbourne- cidade onde mora atualmente.
Erica começou a blogar em 2004 para dividir seu dia a dia com a família e com os amigos que ficaram no Brasil, mas também para não "surtar". Nos EUA, abriu o "Um em Dois", que foi encerrado em seu último dia na América. O " The Jump of The Kangaroo" foi criado assim que chegou à Austrália. Hoje, ele funciona como uma central de notícias no qual ela posta sobre a família que construiu, as viagens e também sobre assuntos australianos.
O "HomeSweetener" surgiu com o propósito de dar dicas de decoração, receitas, entrevistas, além da oferta de serviços de consultoria e tudo que possa ajudar os leitores a transformarem suas casas sem gastar muito dinheiro. "É um blog que nasceu como uma terapia ocupacional para uma mãe que não queria abandonar os filhotes na creche o dia inteiro, mas precisava fazer algo que a movimentasse. Viver na Austrália foi um presente da vida (apesar de eu sofrer com tamanha saudade que sinto da família). Foi um presente das escolhas que fizemos".
Sobre o estilo de vida australiano, Erica diz que muitas coisas a atraem, como a diversidade cultural, a rica gastronomia, que a fez despertar para outra paixão: a culinária. Ela também admira a limpeza e a organização da cidade.
"Se eu fosse citar tudo o que eu gosto em Melbourne, não terminaria de escrever hoje nem amanhã, talvez nem depois. Mas posso dizer que amo o verão, as idas à praia no fim do dia, a chance de dar de cara com uma foca gigante saindo do mar. De ter parques lindos, limpos e bem-tratados por toda parte, independente do bairro que você esteja, do respeito aos espaços públicos, dentre outras coisas".
Os projetos futuros incluem a volta ao trabalho. No momento, além da escrita, usa também o desenho, hábito que resgatou literalmente do fundo do baú.
"Quero ter um tempo para mim e, de quebra, produzir material não só para o blog, mas para quem sabe comercializar num futuro próximo. São nove anos fora do Brasil. Hoje tenho uma vida que jamais imaginei viver: do outro lado do mundo, mas com a certeza de que a Austrália é "the place to be" (o lugar para ser).
Paixão arrebatadora
Há 13 anos, a vida de Carolina Godinho mudou radicalmente ao conhecer um garoto húngaro (Zsombor) em uma discoteca em Sorocaba (interior de São Paulo). Ela conta que ele fazia intercâmbio e só tinha mais dois meses de permanência no Brasil. "Foi amor à primeira vista. Desde o primeiro dia, passamos todas as horas possíveis juntos com medo daquele tempo que passava e da distância que iria nos separar em breve".
Com duas semanas de namoro foi pedida em casamento. O namorado convenceu seus pais de que ela precisava conhecer a família dele na Europa. Ela acabou indo passar as férias na Hungria. Só que o relacionamento mostrou-se impossível. Foram sete meses de separação até que ela decidiu se mudar para o exterior, mais precisamente para a cidade de Pécs.
Inicialmente eles decidiram não se casar porque, na época, ele tinha apenas 18 anos, tinha acabado de entrar na faculdade, e ela estava com 22, com um diploma de publicitária e desempregada. Segundo ela, os pais de ambos os lados tiveram um papel decisivo nesse início de relação tumultuado. "Eles diziam que nosso sentimento era verdadeiro e não queriam ser os responsáveis por um sonho não realizado".
Ela conta que, no início, não tinha o que fazer devido ao bloqueio do idioma (não falava inglês) e não entendia o húngaro (que era muito complicado). O que a ajudou foi ter conseguido um visto de estudante, que a possibilitou aprender inglês, mas demorou quase dois anos para assimilar o húngaro.
Aos 35 anos, trabalha em casa, escreve para blogs, é membro no Conselho de Cidadãos Brasileiros na Hungria - grupo criado pela Embaixada do Brasil - com o objetivo de ajudar brasileiros que chegam ao país. Carolina também está escrevendo um romance sobre sua história e em busca de editoras e de agentes literários que queiram publicá-lo.
Sobre o blog, diz que, após ter os filhos e se dedicar exclusivamente ao papel de mãe, necessitava encontrar algo que a preenchesse além das tarefas cotidianas de mãe e esposa. "Meu marido me deu um ultimato. Ele pediu para que eu buscasse algo exclusivamente meu. Certo dia, frustrada, peguei um papel e escrevi um texto para desabafo. Ele leu, gostou muito e me incentivou a escrever mais".
Assim nasceu o blog "Carol/Hungria", no qual ela buscava treinar a escrita e também servia como termômetro para a ideia do livro. "Queria ver a reação das pessoas, medir as críticas, melhorar e crescer nesta área que despertava fortemente".
Nele, ela escreve sobre assuntos distintos, como reflexões, desabafos e as diferenças entre os dois países. Carolina se autodefine como uma brasungura. "Hoje tenho uma vida que eu amo na Hungria e sei que meu futuro é aqui, mas o Brasil sempre estará ao fundo, como a casa da mamãe para onde podemos correr se houver problemas. Sou grata pela vida que tenho e vivo feliz por ter duas pátrias ao invés de uma. Sou a soma de tudo isso".
Piracicaba
Mas não é somente no exterior que as brasileiras compartilham suas experiências. Pelo Facebook, há um grupo denominado Blogueiras de Piracicaba. No perfil do grupo diz que o objetivo dele é a troca de informações. "Blogueiras Brasileiras" foi criado com a intenção de unir as blogueiras não só da cidade, mas de todo país".
Encontro de brasileiras
Ann Moeller, tem 41 anos, mora na Europa desde 1990. Já viveu em Lisboa, na Alemanha, mas ha 17 anos está na Inglaterra. Depois de fazer faculdade de Engenharia e ter trabalhado com Marketing, em Portugal, decidiu ir para Londres fazer cursos e aprimorar o inglês. Além de ser diretora de uma empresa de marketing que abriu com o marido, mantém dois blogs: o Amarelinha (foco são as famílias no Reino Unido), e o Brasileiras Pelo Mundo (criado com a intenção de se tornar um portal com informações para as brasileiras que moram no exterior). Em breve, lançará seu novo projeto: Shops For Kids ( portal de lojas infantis, com dicas de compras pelo mundo).
Ela explica que o Brasileiras Pelo Mundo surgiu da vontade que tinha de conhecer outras mulheres que viviam no exterior para trocar de experiências. O site cresceu e hoje conta com um time de quase 20 colaboradoras que enviam uma matéria por mês.
Em janeiro deste ano, foi organizado o I Encontro das Brasileiras Pelo Mundo, que contou com quase 40 profissionais brasileiras. “A intenção é chamar atenção para o número crescente de profissionais bem-sucedidas que moram fora”.